Diário: 02/10/2023


• No fim do dia todo mundo morre de morte cerebral
, a diferença é só como você “chega” até lá, como o seu cérebro para de funcionar. Sabe, acho que as pessoas no futuro vão olhar e ficar horrorizadas com quão frágil era o nosso suporte de vida: “Quer dizer que se o seu coração parasse de bater já era e você tava morto?”

• É, engraçado, você fica querendo as coisas e junta dinheiro por anos e anos para tentar conseguir comprar aquilo, só para talvez conseguir comprar uma versão mais barata e vagabunda do que aquilo que realmente queria… enquanto isso, muitas vezes o que você queria tá lá na loja, ninguém usando: um celular, um computador, um violão, um videogame seja lá o que for. Claro, eu sei que não funciona assim, tem o mercado, a economia, demanda e consumo e lero-lero e o número de gente que gostaria de ter aquilo é muito maior do que apenas você, é muito maior do que a quantidade de produtos que tá lá na loja sem ninguém usar. Mas num nível instintivo primitivo parece meio “““injusto”””. Imagino como deve ser ter dinheiro, tipo, ver algo e falar “vou comprar”, sem nem pensar duas vezes. Sem ter que ficar meses e meses, anos até, juntando dinheiro. Simplesmente, viu e comprou. Sonhar não custa nada, não é?

• É curioso pensar em como você explicaria o conceito de filmes gerados por IA para o Georges Méliès. Digo, a progressão do cinema e tal, do rolo de filme as imagens geradas nos espaços latentes em computadores e por inteligências artificiais e o caralho a quatro. Uma evolução inimaginável para as pessoas do fim do século 19.

• É interessante pensar como o conceito da IA generativa acaba se misturando com o conceito de “lost media”, mais especificamente em dois aspectos: primeiro, isso permite “recriar” todo tipo de “lost media” (filmes, entrevistas, áudio, etc). Evidentemente não vai ser a coisa real, mas será uma aproximação muito próxima baseado nos registros históricos disponíveis. Você tem um roteiro de um episódio do Chaves que foi perdido? Essa IA analisará todos os episódios do Chaves e irá criar um roteiro e ao julgar pela qualidade do material apenas, será indistinguível de um episódio gravado na época. O segundo aspecto, claro, é que vai ficar muito difícil saber o que era autêntico e o que não era, porque você provavelmente vai ter que buscar respostas sobre isso fora do material. Por exemplo, onde esse registro foi achado? Existe algum documento, algum relato humano de alguém que esteve lá e pode confirmar que esse material é autêntico?

• Outro aspecto interessante é “converter” filmes antigos para formatos atuais. Claro, vai ter quem diga que isso é sacrilégio e blá blá blá. Mas suponhamos que você queira uma versão do clássico “The Great Dictator” filmado colorido por uma câmera Red Epic-W Helium 8K, com o áudio captado por microfones Sennheiser MKH 416, e, claro, em widescreen com a IA imaginando como seria o resto da cena que não foi filmado originalmente. A IA vai analisar o filme e essencialmente reconstruir todo um novo filme usando o antigo como referência – para usar o linguajar da IA generativa, pense nisso como um video-to-video usando controlnets.

• Inspirando-me na célebre frase de Dawkins: “Most art will never be seen because they will never going to exist. The potential masterpieces who could have been in the Louvre and other renowned museums but who will in fact never see the light of day outnumber the sand grains of Arabia. Certainly those unborn ghosts include poems greater than “Do not go gentle into that good night” and “Ode”, films greater than “Forrest Gump”. We know this because the set of possible art allowed by rearranging words, ink in a canvas and pixels in a scream massively exceeds the sets of possibilities that time and money allows humans to create”: E… a razão pela qual a IA, a inteligência artificial generativa é tão absolutamente fascinante é o que ela revela, e o que ela nos permite vislumbrar, os mundos que ela nos abrem as portas. A arte criada pelas máquinas nos traz mais próximo de contemplar e de garantir que – ao menos e no mínimo – toda arte que alguém gostaria de ver exista e exista na melhor e mais perfeita e majestosa execução da mesma. E isso é incrível, isso é o sonho. Toda a criatividade possível.

• Eu acho que os escritores de ficção científica tem um papel gigantesco em guiar a humanidade e imaginar e vislumbrar algo tão absurdo e falar “Cara, e se isso fosse possível? Como seria o mundo?”. Nós devemos muita coisa a eles.

• Muitas gerações pensaram que o seu tempo de vida era excepcional, mas e se o nosso caso for verdade? E se o destino nos reservou a oportunidade e o privilégio de testemunharmos eventos que mudariam o mundo para sempre? Eventos do tipo que você cria calendários de “Antes e Depois” dele acontecer?

• Esses dias eu fui ouvir a discografia do Erasmo Carlos, no fim de um dos CDs, “Amar Pra Viver Ou Morrer de Amor” lançado em 1982 tem uma entrevista dele. Imagino que na era pré-internet e até mesmo pré-MTV isso fazia bastante sentido. E é muito interessante ver os pensamentos dele, e ele falando sobre a vida e a geração dele e afins. Lembra ligeiramente uma crise de meia idade, mas não num sentido ruim. E, de fato, era o meio da vida dele – ele nasceu em 1941 e o CD é de 1982 e ele morre em 2022, 40 anos depois, então, você tem essas reflexões sobre a vida de um homem no meio de sua jornada. De certa forma, muitas vezes lendo um livro ou ouvindo uma entrevista, ainda mais uma entrevista tão natural e aberta assim, parece que duma estranha forma você tá tendo uma “conversa” com alguém, desafiando o espaço-tempo. Não é uma conversa de fato, evidentemente, mas duma forma poética, digamos assim…

• Muitas vezes a coisa acontece e você só vai ver o resultado disso anos e anos depois. A gente vê o Massacre do Carandiru que acabou dando origem ao PCC que, 14 anos mais tarde, acabou resultando nos ataques de 2006 que pararam o Brasil, e a gente contrasta isso com o que vem acontecendo com os manifestantes do dia 8. Teve gente pagando muito, muito, muito além do que aquilo que ele realmente devia. Teve gente com a vida arruinada. Não acredito que essas penas absurdas serão revistas em momento algum, e é difícil não pensar no que esse abuso dará origem? Talvez não seja amanhã, nem ano que vem, mas daqui a 10, 15, 30 anos. Esse pessoal tem filho, o que o filho de alguém que viu o pai ficar preso praticamente 20 anos na cadeia por que ele protestou vai pensar? Há muita revolta sendo armazenada aqui e os efeitos disso nós só vamos ver anos e anos no futuro. Uma hora a barragem estoura.

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